quinta-feira, 23 de outubro de 2008

À Adelina e aos que ficam

No final de uma tarde ensolarada, ao olhar para o céu, procurei encontrar o arrebol expressão que minha avó Adelina falava ao referir-se à hora do dia em que o fogo rouba a cena do sol, no exato momento do soar dos sinos e do cântico da Ave-Maria. Um momento quase sagrado onde deveríamos apenas contemplar serenamente a natureza ou como os religiosos chamam estar com Deus em silêncio, longe do barulho das cidades e dos homens, para que possamos nos ouvir e ouvir o outro.Falo de silêncio porque é a única forma que encontro para amenizar a dor da perda, falo, é claro, por meio das palavras que podem ser lidas no silêncio. Durante muitos anos minha avó esperava ansiosamente pelo seu cartão de natal escrito por mim, ela sempre adorou as palavras, principalmente aquelas bonitas, que faziam as lágrimas caírem pelo seu rosto. Ela também escrevia belos cartões de aniversário, depois que crescemos, os nossos presentes vinham em envelopes, tenho todos eles guardados. Outra coisa que ela adorava era procurar os sentidos das palavras, os sinônimos e os antônimos nas palavras cruzadas. De certa forma, herdei isso dela, mas de um jeito diferente, pois a minha maior expressão é por meio das palavras, ao pensar sobre elas, colocá-las no papel, dizê-las ao outro, mostro a minha dor. Assim como expresso o meu amor por todos os que ficam porque é sempre em vida que falamos de amor.
À minha querida avó Adelina que partiu na noite de de outubro de 2008.

terça-feira, 14 de outubro de 2008

The woman's labour

Um relato de um mulher trabalhadora, Mary Collier, então uma lavadeira de Petersfield, Hampshire, em 1739:

[...] e qundo chegamos em casa,
Ai de nós! vemos que nosso trabalho mal começou;
Tantas coisas exigem a nossa atenção,
Tivéssemos dez mãos, nós as usaríamos todas.
Depois de pôr as crianças na cama, com o maior carinho
Preparamos tudo para a volta dos homens ao lar:
Eles jantam e vão para a cama sem demora,
E descansam bem até o dia seguinte;
Enquanto nós, ai! só podemos ter um pouco de sono
Porque os filhos teimosos choram e gritam
[...]
Em todo trabalho (nós) temos nossa devida parte;
E desde o tempo em que a colheita se inicia
Até o trigo ser cortado e armazenado,
Nossa labuta é todos os dias tão extrema
Que quase nunca há tempo para sonhar.


Retirado do capítulo "Tempo, disciplina de trabalho e o capitalismo industrial"do livro Costumes em Comum de E. P. Thompson.