domingo, 26 de agosto de 2007

O que a sociedade brasileira realmente quer mudar?

por Vero Castanheira

A discussão que envolve a corrupção policial e atuação do BOPE não é recente, nem mesmo uma abordagem original para um filme. Há oito anos foi lançado "Notícias de uma guerra particular", de João Moreira Sales, excelente documentário onde revela através de imagens e depoimentos a guerra do tráfico com a polícia. No entanto, é preciso ter o cuidado para não confundir imagem e imaginário, ficção e realidade. No caso do livro "Elite da Tropa" escrito por três homens, sendo estes dois ex-policiais do BOPE e um sociólogo, a história pode ser perfeitamente confundida com a memória, justamente onde está o equívoco, pois a memória carrega consigo o que é importante lembrar e o que deve ser esquecido. Quando a linguagem escrita transforma-se em imagem dá o toque de realidade necessário para que o espectador faça a síntese e acredite nela. Até porque é mais fácil acreditar no que se vê do que pensar sobre o que está sendo revelado.

Já o filme "Tropa de Elite" apresenta o olhar crítico de dois homens que atuaram no BOPE e que ainda encontram-se na polícia, logo devem ter o cuidado com o que dizem, até porque estão arriscando as próprias vidas com denúncias falsas ou verdadeiras. A gente sempre tem a pretensão de querer buscar verdade em tudo e nunca consegue. Não há como saber a veracidade da informação sem investigação, não há como confiar na imagem da película nem mesmo na escrita que não se define como ficção ou não.

De qualquer modo, o filme levanta mais questões do que respostas; apresenta relações importantes a serem pensadas e discutidas na sociedade, mas é claro que a mídia não terá o mínimo interesse em discuti-las, até porque não existe democracia midiática, mas uma ditadura da informação. Cabe a nós, levarmos estas para as salas de aula, para os blogs e grupos de discussão. Por exemplo, qual é realmente a atuação do BOPE? Qual é a opinião dos moradores das favelas sobre o BOPE? Qual é a participação política da sociedade civil diante da violência na cidade do RJ? E ainda, o consumo de drogas como alimento ao tráfico e o armamento negociado entre a polícia corrupta e os traficantes.

São muitas questões a serem debatidas, a idéia de um fórum é mais do que bem vinda, é necessário. Não podemos ficar a margem das discussões, simplesmente porque não vivenciamos de perto estas trágicas relações de poder e violência. Quando eu militei num partido político de esquerda, participei de reuniões da campanha contra o caveirão e o BOPE, neste período eu pensava ingenuamente que era uma violência sem tamanho a atuação do BOPE nas favelas, o modo como chegavam e entravam desreitando os moradores. No entanto não havia nenhum morador nestas reuniões contra o caveirão; meses depois, quando eu já não estava mais nem militando nem no partido, li uma matéria no jornal O Dia que me surpreendeu, dizia que os moradores das favelas aprovavam a atuação do BOPE, que a presença destes policiais nos morros os deixam seguros em relação a pressão sofrida pelo tráfico.

Tudo bem, são dois discursos, o primeiro do partido político distanciado da realidade, mas com um bom referencial teórico sociológico persuasivo e o segundo a mídia com a intenção de manipular discursos favoráreis e criar realidades.Cabe, ainda, outra pergunta: O que a sociedade brasileira realmente quer mudar?
A hipocrisia, melhor denominação para a sociedade brasileira, talvez seja o principal argumento da imobilidade frente à realidade, ou seja, as classes média e alta vêem os fatos como míopes sem óculos, contribuem de certa forma para a permanência da violência. Porque na medida em que silenciam a desigualdade social, banalizam a violência e assinam embaixo do que a rede globo afirma diariamente como uma realidade imensurável, estão compactuando com discursos e práticas do sistema.

A corrupção parece uma prática comum para esta mesma sociedade, está no dia-a-dia do brasileiro quando o mesmo é o primeiro a corromper a polícia, subornando-na para esconder seus delitos (o flagrante do baseado, estacionar em local proibido, avançar o sinal, subornar o funcionário público para a fila andar depressa e etc).

A discussão deve abraçar toda a conjuntura social ao invés de focar apenas num aspecto da realidade brasileira, afinal, este é o papel teatral da imprensa brasileira: o lançamento diário de notícias nos jornais e nas demais mídias onde apresentam uma visão parcial e preconceituosa de um fato, e quanto pior, sem direito à resposta.

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