domingo, 15 de julho de 2007

Consumo Consciente

por Vero Castanheira

Nem sempre a gente consegue colocar em prática o que pensamos, muitas vezes corrompemos o nosso ideal por um prato de comida ou para alimentar outros desejos ou outras pessoas, mas uma coisa é certa, devemos sempre questionar os nossos atos porque o que vivemos são o seu reflexo.

Muitas pessoas se consideram religiosas outras se consideram de esquerda, porém a prática militante, seja política seja religiosa é contraditória, é preciso estar atento e forte no ideal para não sermos manipulados pelos meios de comunicação de massa e pelo clichê ineficaz e passivo de que tudo é assim mesmo e nada vai mudar.

Vivo meus dias inconformada com o que vejo, esta terrível realidade social maquiada pela propaganda onde a cultura construída junto as mídias reforça cada vez mais a estética do consumo, daquilo que tem prazo de validade e é descartável. A história já não interessa, as relações humanas muito menos, o que importa hoje é o que você tem e o que você pode oferecer em ganhos materiais.

Será que as pessoas não percebem que esta cultura vem se afirmando não apenas no plano material como essencialmente nas relações humanas, sejam de trabalho, sejam amorosas, sejam familiares?

Bom, é sobre isso que quero conversar; sobre como a cultura consumista tem avançado nas demais relações estabelecidas entre homens e mulheres, como o ser humano está passivo diante do que é dado pela mídia como valor inquestionável. Em tempos de banalização da violência, naturalização do consumo, torna-se banal dizer eu te amo e virar as costas num momento de aperto. Os valores humanos perdem a sua coerência quando são levados pela propaganda para vender produtos cujas marcas impõem ideais de vida, a solidariedade, por exemplo, é o valor mais utilizado pela mídia e pelas empresas quando precisam justificar a exploração do trabalho e do meio ambiente. Para ser mais objetiva, vamos lembrar da responsabilidade social, o que é isso? Uma forma dos empresários (entenda-se aqui dono de empresas) posarem para a mídia como os capitalistas corretos, como se houvesse essa possibilidade, mas é claro que essa construção é tão bem definida pelos setores de marketing das empresas que a maioria das pessoas caem no conto do vigário.

Pensem bem, o que vocês entendem por responsabilidade social?

Não vou falar aqui o que eu penso sobre esta questão deixo que vocês comprovem nos discursos dos marketeiros o que eles realmente pensam sobre isso, portanto selecionei algumas citações de um site para a devida compreensão do que realmente interessa aos empresários e acabar com este discurso inventado por setores estratégicos de que existe ética e responsabilidade no mundo empresarial. Confira abaixo:

"As empresas vivem um momento onde está cada vez mais dispendioso aumentar a participação de suas marcas no mercado. Os clientes, cada vez mais exigentes, tornam-se difíceis de ser fidelizados e todo diferencial possível precisa ser explorado a fim de ajudar a marca a manter (ou aumentar) sua participação em mercados cada dia mais concorridos. O Marketing Social representa uma oportunidade importante para as marcas passarem a um patamar superior, é uma forma efetiva de diferenciar produtos e melhorar a imagem corporativa. Por este motivo, é crescente o número de empresas que fazem promoções ou associam sua imagem a causas sociais, como forma de estimular vendas ou agregar valor a sua imagem institucional. Do ponto de vista do consumidor, adquirir produtos de uma empresa ou marca que esteja associada a uma causa social relevante é uma ótima oportunidade de tornar real o desejo de participar, pertencer, compartilhar e sentir a auto-realização, característicos do topo da Hierarquia das Necessidades de Maslow. A fim de viabilizar esta estratégia de atuação, as empresas firmam acordos com entidades sem fins de lucro, que executam as ações propostas e, em seguida, convidam os consumidores a colaborarem com a causa, simplesmente consumindo produtos daquela marca. A idéia, muito boa do ponto de vista estratégico, precisa ser planejada com antecedência, para que o processo funcione bem". Os desafios do gerenciamento de ações de Marketing Social, artigo não assinado.

Já o artigo abaixo é mais sincero:

"Sem qualquer concessão a ilusões de um “novo mercado bonzinho”, falamos de business e dos benefícios que o modelo de gestão da Responsabilidade Social pode propiciar às empresas. Tornando-as ainda mais ricas e perenes sem o ônus do preconceito em relação ao "visado lucro", na medida em que este enriquecimento extrapola sua divisão entre proprietários e acionistas e também incorpora outros agentes envolvidos no process colaboradores, clientes, consumidores, fornecedores, governos, comunidades e tantos outros". Tanya Rothgiesser,O que é socialmente responsável?

Em nenhum momento os marketeiros, ou os capangas dos empresários, levantam a questão de melhores salários aos seus empregados e melhores condições de trabalho, no entanto utilizam definições vagas sobre os conceitos de ética e todas as demais questões intrínsecas as relações de trabalho. Não é isso que está em jogo, o que querem, como podemos perceber acima, é a fidelização do cliente à marca e para isso apelam para as causas sociais persuadindo os consumidores a uma falsa consciência e atitude moral. Deturpam o sentido de consumo consciente, ou seja, os fins justificam os meios para elevarem as cifras de suas contas bancárias.

Quando você consome o produto de uma dessas empresas você está validando o discurso dos capitalistas humanitários, ou seja, você é presa fácil como também está contribuindo para a permanência deste sistema. Se você acha isso tudo uma grande bobagem tudo bem, continue consumindo e enriquecendo o bolso destes caras, viva como Polyana e simplesmente aceite a vida com ela é, ou melhor como um produto da propaganda, mas não reclamem jamais dos altos salários dos deputados, das injustiças sociais, do seu próprio salário, de como o seu chefe estabelece uma relação exploratória com você e com os seus colegas de trabalho. Todas as relações estão permeadas pelos valores culturais que legitimam o sistema político-social que vivemos.

Outro exemplo deste discurso picareta é o da Fundação Bradesco, inclusive ganhou o prêmio empresarial de responsabilidade social este ano, apesar do alto índice lucrativo que o banco mantém com seus clientes cobrados nas taxas, nos juros e nas tarifas bancárias, desconta seus impostos em ações sociais. Interessante perceber que a palavra ética está sempre nos panfletos dos empresários, o texto é tão bem construído que você acaba por acreditar. No site da Fundação Bradesco há o portal do voluntariado que na verdade deveria se chamar o portal do otário! A hipocrisia é tão escancarada, como é possível algum cidadão trabalhar de graça para um banco! Vocês não acreditam? Pois é, são 21 mil brasileiros voluntários.

Confiram o discurso:
"A Fundação Bradesco é uma entidade sem fins lucrativos fundada em 1956 por Amador Aguiar, para oferecimento de Educação Básica, Profissional e de Jovens e Adultos às comunidades carentes. Hoje são 40 escolas localizadas nos 26 Estados e no Distrito Federal, onde foram atendidos 108.151 estudantes em 2006.
A Fundação Bradesco e o VoluntariadoPor meio de suas unidades escolares, ao longo dos anos, a Fundação Bradesco tem incentivado a realização de ações voluntárias. E a partir de projetos envolvendo a participação de educadores, alunos e pais, beneficia instituições, ONGs e a própria comunidade. O Dia Nacional de Ação Voluntária tornou-se um dos principais exemplos de atuação da Fundação Bradesco e de sua política de valer-se em favor dos serviços de democratização do acesso ao conhecimento, uma opção a mais na missão de transformar comunidades, integrar localidades e difundir cidadania".

O discurso não é sedutor? Que tal se cadastrar como voluntário de um banco?

Abaixo veja o discurso de cidadania vinculado a uma conta bancária, intitulado Inclusão Bancária(sem gozação, é o título desta matéria):

"Somente a partir de 2002 é que milhares de brasileiros passaram a ter acesso às facilidades e benefícios do sistema bancário. Esse salto, que se confunde com cidadania e conquista, é um dos resultados mais visível do Banco Postal, a parceria entre o Bradesco e a Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos. Também são resultados práticos dessa combinação de esforços a inserção de centenas de municípios à estrutura financeira do país e o suporte ao desenvolvimento sócio- econômico, possibilitando que os recursos circulem nos próprios municípios, fomentando a poupança local. O Banco Postal já reúne cerca de 5,4 mil unidades - distribuídas por mais de 4800 municípios - e 5,1 milhões de brasileiros bancarizados. Desse total, quase 3,6 milhões têm renda mensal inferior a três salários mínimos".

Não se enganem a respeito do papel da cultura, da comunicação de massa e da propaganda, pois são concepções e produções do homem, principalmente das elites, cujo foco social é a permanência da ordem e progresso do consumo. Logo consumir com consciência é uma prática política necessária como instrumento de oposição a essa cultura dada como realidade imutável.

E como os empresários riem de você, consumidor inconsciente, se lambuzam no próprio gozo, porque é tão fácil manipular desejos, afagar o ego do cliente e construir a imagem do tipo ideal; no entanto, apesar, do consumo desmedido como recompensa de frustrações ou simplesmente a procura de ilusões nem sempre baratas de felicidade como um produto, a solidão e o desamor disputam os maiores índices de suicídio nos infográficos mundiais.

Fontes pesquisadas:
Fundação Bradesco
Revista Responsabilidade Social

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